MEMÓRIA E GRATIDÃO: 83 ANOS DA IGREJA PARTICULAR DE PINHEIRO

Arthur Aurélio¹

Carlos Fernando S. Brito²

Que a memória é um “órgão espiritual” importante, isto é pouco discutível. A esse respeito já testemunharam muitos pensadores ao longo da história, desde filósofos a teólogos e historiadores. Platão, por exemplo, falava da memória como instrumento para o conhecimento das ideias perfeitas. Santo Agostinho falava da memória como um palácio onde encontrar-se consigo mesmo e no autoconhecimento se descobre a Deus. Leonardo Boff fala da memória como ressaborear o sabor e o Papa Francisco afirma que faz bem ao coração do cristão fazer memória de seus passos com Deus. Entretanto, como se constrói a memória? Através da criação de narrativas sobre fatos que compõem a história. Enquanto Igreja Particular de Pinheiro o que temos em nossa memória? Pois, bem, hoje nosso desejo é contribuir com a construção dessa memória coletiva diocesana, narrando os passos dados há 83 anos, quando, “para o engrandecimento dos fiéis leigos”, fomos feitos Prelazia de Pinheiro.

Tudo começou em 1939, quando, por decisão da Nunciatura Apostólica no Brasil, atendendo à solicitação da Arquidiocese de São Luís do Maranhão, na pessoa do Exmo. Sr. Arcebispo Metropolitano, Dom Carlos Carmelo de Vasconcellos Motta, foi criada a Prelazia para ser instalada na Baixada Ocidental do Maranhão.  

Inicialmente, a cidade de Viana credenciava-se para receber a instalação da sede Prelatícia, mas, graças a interferência do desembargador Elizabetho Carvalho, reforçada pelos apelos do primeiro padre pinheirense e Vigário de Pinheiro naquela época, Pe. Newton Inácio Pereira, ficou estabelecido que a cidade de Pinheiro sediaria a nova Prelazia. 

Assim, foi criada a nova Prelazia pela Bula Ad maius Christifidelium, do Papa Pio XII, a 22 de julho de 1939, tendo sido desmembrada da Arquidiocese de São Luís do Maranhão e da Prelazia de São José de Grajaú, hoje Diocese de Grajaú.

A Prelazia de Pinheiro foi confiada pelo Papa Pio XII aos Missionários do Sagrado Coração, porém, os horrores da Segunda Guerra Mundial, em plena efervescência, impediram a vinda dos primeiros missionários.

Durante esses sete anos que antecederam a chegada dos Missionários do Sagrado Coração foram nomeados três Administradores Apostólicos, sendo eles: Dom Carlos Carmelo de Vasconcellos Motta, Arcebispo de São Luís do Maranhão, para o período de 1940 a 1944; Pe. José Maria Lemercier, de 1944 a 1946; e o terceiro e último Administrador foi o Pe. Afonso Maria Ungarelli, MSC, que chegou a Pinheiro chefiando o primeiro grupo de Missionários, durante os anos de 1946 a 1948.   

Há 25 de dezembro de 1943 foi feita a instalação oficial da Prelazia por ocasião da Celebração da Missa de Natal, na Igreja Matriz de Pinheiro, estando presentes o Arcebispo de São Luís; o Vigário de Pinheiro, Pe. Newton Pereira; o Cônego Frederico Chaves, Pe. Francisco Ribeiro, Pe. Antônio Dionísio, dois seminaristas, além do juiz de Direito, do Prefeito Municipal, Dr. Antônio da Costa Rodrigues, e de grande multidão de fiéis.    

A chegada dos primeiros nove missionários italianos só se verificou a 15 de agosto de 1946. Eram eles: Pe. Afonso Maria Ungarelli, Pe. Hamleto de Angelis, Pe. Fernando Meloselli, Pe. Pedro Sambalino, Pe. Cornélio Maria Dan, Pe. Fiorino Fiorini, Pe. Augusto Mozzetti, e Pe. Humberto Giungarelli e Frei José Preziosa. Eles vieram com o objetivo de prestar assistência espiritual e social neste território maranhense.

A nova Prelazia passou a abranger todos os municípios litorâneos do norte do Estado, a saber: Pinheiro, Alcântara, Cururupu, Guimarães, Bequimão e Santa Helena, até então pertencentes a Arquidiocese de São Luís do Maranhão e os municípios de Turiaçu e Carutapera, pertencentes a Prelazia de São José de Grajaú. Mais tarde, por um Decreto da Congregação Consistorial, em 24 de fevereiro de 1958, a Paróquia de São Bento passou a fazer parte da Prelazia de Pinheiro e com seu desmembramento foram incluídas as novas Paróquias de Peri-Mirim e Palmeirândia.

Nas palavras de Dom Afonso sobre esses anos de evangelização “As Prelazias ‘nullius’ do Brasil são verdadeiras missões pois: 1. Com efeito, não tendo clero local, são territórios confiados a ordens ou congregações religiosas ou institutos missionários para aí implantarem a Igreja. Esta razão é fundamental e por si própria suficiente para definir a Missão; 2. Acresce, porém, que, apesar dessa população ser batizada na sua maioria, não pode ser considerada cristã: a maior parte não conhece as verdades fundamentais da fé nem os Sacramentos; não há, pois, prática cristã. Acrescentemos que muitos negros e mestiços guardam suas tradições animistas da África. Quanto aos Índios, a grande maioria não é batizada, porque evitam qualquer contato […] A área dessas Prelazias amazônicas é verdadeiramente imensa, pois abraça quase metade do Brasil que tem 8.500 000 quilômetros quadrados. O clima quente e úmido, não é bom. Domina por toda a parte o impaludismo e doenças tropicais; não há estradas e, nas florestas virgens, nem caminhos também. Aliás, as viagens por terra são sempre dificultadas por ribeiros e pântanos; as de barco são muitas vezes intermináveis (podendo demorar semanas ou meses) e perigosas. Apesar de tudo, a população aumenta e rapidamente, seja pelo índice de crescimento (um dos mais altos do mundo: 23/1000), seja pela contínua imigração. […]” (UNGARELLI, 1965, p. 101-102).

Pe. Afonso Maria Ungarelli, um dos nove missionários que aqui chegaram, foi nomeado o 1º Bispo Prelado, cargo que exerceu por 26 anos, de 1949 a 1975. Trabalhou aqui como Bispo Auxiliar de Dom Afonso, por dois anos de 1963 a 1965, o futuro Bispo de Zé Doca, Dom Guido Maria Casullo. 

O sucessor de Dom Afonso e 2º Bispo da Prelazia foi Dom Carmelo Cassati que permaneceu durante os anos de 1975 a 1978, quando teve que renunciar por motivos de saúde. Voltou para a Itália, mas foi nomeado como Bispo para três Dioceses e uma Arquidiocese. Ainda que longe do Brasil, pelo menos parte do coração de Dom Carmelo ficou certamente conosco, como é provado pelo fato de que, em 1994, enviou a Dom Ricardo sacerdotes do seu Clero para tomarem conta da Paróquia de Santa Helena.  

A Dom Carmelo sucede Dom Ricardo Pedro Páglia. No entanto, no dia 16 de outubro de 1979, pela Bula Cum Praelaturae, o Papa são João Paulo II elevou a Prelazia ao estado de Diocese e promove Dom Ricardo à condição de 1º Bispo Diocesano, cargo que exerceu até janeiro de 2013, portanto durante 33 anos, até a tomada de posse do atual Bispo diocesano, Dom Elio Rama, IMC.

Se a fé chegou até nós é porque atravessou as tempestades da história nos ombros de gigantes. Neste dia, em que celebramos 83 anos de criação da Igreja Particular Pinheirense, devemos elevar uma prece de louvor a Deus por tantos missionários e missionárias que se doaram na evangelização de nossas terras. Como forma de gratidão devemos apenas garantir que a chama do ardor missionário jamais se apague nestas terras e que a memória de seus feitos portentosos jamais seja esquecida. “O que a memória ama, fica eterno” (Adélia Prado) e, por isso, é preciso amar e conhecer a nossa história enquanto Igreja Particular, a fim de que com ela eternizemos a fé que aqui fora construída. 

Viva a Igreja Particular de Pinheiro!

Ad multos annos!

  1. Graduado em Comunicação Social – Publicidade e propaganda; Membro da equipe de comunicação diocesana.
  2. Doutorando em Filosofia (UFMG) e Professor do DEFIL (UEMA); Membro da equipe de comunicação diocesana.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *