DIA DE FINADOS: FÉ E ESPERANÇA

Pe. Tássio Mariano Marques¹

A Igreja, desde a sua existência, sempre rezou pelos mortos. Esta prática que a Mãe Igreja segue está fundamentada nas Sagradas Escrituras: “Eis por que ele mandou oferecer esse sacrifício expiatório pelos que haviam morrido, a fim de que fossem absolvidos do seu pecado” (2Mac 12,44). Em toda Santa Missa a Igreja reza pelos fiéis defuntos, oferecendo no Altar o Corpo e o Sangue do Nosso Senhor Jesus Cristo pelo descanso e repouso dos irmãos e irmãs falecidos.

Apesar que em toda Missa são recordados os falecidos, no século X a Igreja institui a Comemoração de todos os Fiéis defuntos. Assim, a Igreja como Mãe faz com que todos os seus filhos cumpram o dever cristão de rezar pelos mortos. A pergunta que pode palpitar dentro de nós é: por que rezar pelos falecidos? Primeiramente, rezamos por confiar que a nossa oração os ajudará no seu encontro definitivo com Deus. Fazemos isso pautados naquilo que nos ensina as Sagradas Escrituras, sobretudo o segundo livro de Macabeus. Também por ser algo que faz parte da nossa fé, pois todos os domingos, ao professarmos a Fé, admitimos que acreditamos na vida eterna e na ressurreição dos mortos.

Essa piedosa prática de rezar pelos irmãos e irmãs falecidos nos remete aquilo que nos ensina o Concílio Vaticano II, na Lumen Gentium, acerca da tríplice dimensão da Igreja: peregrina, padecente e triunfante. A Igreja peregrina reza pela Igreja padecente a fim de alcançar a Igreja triunfante. Desse modo, não se deve esquecer que aqueles que já partiram desta vida também formam a Igreja. É a comunhão dos Santos (CIC, n. 946). “Todos juntos formam, em Cristo, uma só família, a Igreja, para louvor e glória da Trindade” (Compêndio do Catecismo da Igreja Católica, n. 195). Por isso, nós rezamos para que os irmãos e irmãs falecidos sejam purificados de seus pecados e possam participar do convívio de Deus e das alegrias celestes.

Neste Dia de Finados, em que os nossos corações se voltam a rezar pelos nossos entes queridos de forma mais especial, queremos ajudar a compreender melhor três temas na Escatologia Cristã, que muitas vezes são questionados e deixam dúvidas em muitos católicos, a saber: Purgatório, Juízo e Ressurreição. Como entender tudo isto? O que é Purgatório? Existe de fato? Como será o Juízo? Todos ressuscitarão? Essas são algumas inquietações presentes em nossos irmãos e irmãs.

Os católicos acreditam no Purgatório. Não iremos encontrar na Bíblia o nome Purgatório, mas encontramos a ideia que ele representa. Essa reflexão começou na Igreja antiga a partir do texto bíblico de Macabeus (2Mac 12, 41-46), no qual se mostra a prática de rezar pelos mortos. Também a ideia de um “fogo purificador”, para purificar os pecados, ganhou força com Clemente de Alexandria, Orígenes, Cirilo de Jerusalém e também Agostinho, a partir do texto de Lucas 16,19-26.

A partir dos Concílios de Lyon, Florença e de Trento, a Igreja definiu o Purgatório como um dogma de fé. Através de uma longa discussão e dos pensamentos dos Santos Padres da Igreja, chegou-se à conclusão de que o Purgatório não é um “lugar”, mas uma “situação de purificação”, ou seja, “uma situação espiritual”. Também não se pode enxergar o Purgatório como uma vingança, castigo ou algo do tipo, mas como sinal da misericórdia de Deus, que deseja que todos sejam salvos (1Tm 2,4).

Desde o início da Patrística, os Padres da Igreja confiavam na existência do Purgatório como um “estágio de purificação” para contemplar a face de Deus. O grande santo da Igreja, Irineu de Lião, em sua obra Contra as heresias, afirma que o único sofrimento que existe no Purgatório é a ausência de uma comunhão plena na visão total de Deus.

Ao longo do tempo, muito se tem discutido sobre Juízo Particular e Juízo Final. O principal conceito que temos sobre esse assunto é extraído do Catecismo da Igreja Católica, no qual, sobre o Juízo Particular, ensina: “Cada homem recebe em sua alma imortal a retribuição eterna a partir do momento da morte, num Juízo Particular que coloca a sua vida em relação a vida de Cristo” (CIC, n. 1021-1022).

Sobre o Juízo Universal ou Final, o Catecismo da Igreja Católica, no parágrafo 1040, afirma: “O Juízo Final acontecerá por ocasião da volta gloriosa de Cristo”. Percebemos que há uma diferença entre Juízo Particular e Juízo Final, pois, enquanto o Particular é só a pessoa com Deus, o Juízo Final é uma reunião com todas as criaturas, em que conhecerão todas as injustiças cometidas por elas no mundo. É por isso que Irineu de Lião define o Juízo Universal como um “momento de discernimento da conduta humana”.

O ponto alto da nossa fé é a Ressurreição e esta não pode ser entendida como mera reanimação de cadáver, que depois volta a morte, tampouco deve ser confundida com reencarnação. A Ressurreição deve ser entendida como uma passagem desta vida para uma vida plena e ela não acontece pela metade, mas acontece por completo, a partir daquilo que somos: corpo, alma e espírito.

São Boaventura nos traz uma certeza sobre a Ressurreição, ao afirmar que a Ressurreição é para todos os que forem salvos no Juízo, sendo que ressuscitarão na medida da plenitude de Cristo. Todos os corpos ressuscitarão, tanto dos bons quanto dos maus em sua identidade numérica. Os defeitos corporais dos justos serão corrigidos. 

Neste dia 02 de novembro, dia em que a Igreja faz a comemoração de todos os fiéis defuntos, queremos ainda mais aumentar a nossa fé e a nossa certeza na Ressurreição. Também é um dia para refletirmos sobre a nossa vida e sua brevidade. Tenhamos a plena certeza de que a morte não é o fim: existe a vida eterna e nela acreditamos. Essa vida consiste na presença de Deus-Trindade, Maria, anjos e santos. Portanto, continuemos a rezar por nossos entes queridos, pois como afirmou o Papa Bento XVI: “o caminho da morte é uma senda da esperança e percorrer os cemitérios, como também ler as inscrições sobre os túmulos, é realizar um caminho marcado pela esperança de eternidade”.

  1. Padre Diocesano da Diocese de Pinheiro, atualmente é Pároco da Paróquia do Santíssimo Salvador – Apicum-açu/MA

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